Naquele ano, os trovadores da Ribeira resolveram cantar as suas ancestrais trovas no Paço.
Mas na realenga vila, alguns habituados que estavam a só eles terem festa, ele eram caçadas, as canas, os torneios de canasta, os saraus literários, as procissões; no teatro eram as farsas, as comédias, não viram com bons olhos o aparecimento da nova trupe de comediantes. Que eram o fim das suas imitações e plágios, diziam.
Na Sintra de Inverno havia um bobo da corte, que de quando em vez trinava a erva-cidreira, combinou com um escravo que no Paço residia, e que de vez em quando era chamado à realenga vila, para a votação em carneirada, e à traição mudaram as fechaduras, para impedir que houvesse quem lhes fizesse sombra, que ninguém lha queria fazer.
Consta que o rei não gostou e intimou-os a que tivessem a porta aberta na hora do espectáculo no Paço da Ribeira, já programado pelos novos rapsodos.
Então, como tinham que abrir a porta, mas não queriam abrir a porta, em cima da hora, resolveram abrir sem abrir, assim como no conto, em que um tal João-Sem-Cuidados deveria, perante o rei, apresentar-se ao mesmo tempo, nem vestido nem despido, nem a cavalo nem e a pé, nem calçado nem descalço, eles foram pela calada da noite e abrindo a porta, deixaram-na fechada e às escuras.
Só que o assunto não ficou resolvido porque os novos rapsodos exigem ser tratados com a dignidade que merecem.
(Este conto remete para o ano de 1527, ao tempo de Mestre Gil, Qualquer semelhança com o presente é pura coincidência.)
Este cronista vai abrir um buraquinho da fechadura da porta e o leitor pode espreitar como decorreu esse espectáculo.
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