sexta-feira, 30 de abril de 2010

Ritual de Trabalho - Lorenço

Nos dias de calor, no canto das mulheres, ressoavam, entre súplicas à Senhora do Castelo, uma súplica, que vem de tempos imemoriais. De tempos anteriores à romanização, ao tempo da língua Ugarítico-Cananita, falada na península no tempo dos Fenícios. E o que nos diz o Professor Moisés Espírito Santo, (meu professor), no seu livro "Fontes Remotas da Cultura Portuguesa".Lourenço, Lhrsm, laarassim, que significa "esconjuro". Reparem como aquela mulher da ribeira de Muge, faz um esforço para se recordar do nome pelo qual os seus ancestrais clamavam por uma réstia de vento, para de alguma maneira esconjurar o sol, nas horas em que o sol abrasava os corpos, no trabalho de sol a sol.

Clique: Vai te sol

sábado, 24 de abril de 2010

Aleluia!

Até que enfim, que os dignos zeladores do património de Paço dos Negros se dignaram limpar uma nódoa que ali estava desde a passagem do ano.

Mas será que tiveram consciência do mal que causam a este património do Paço, que não é só o Pórtico, como sempre afirma o lóbi instalado em Almeirim, dito do Restopórtico, ao fazerem uma fogueira em cima de uma laje de tijoleiras, que não se sabe a que era pertence?




Já agora, para quando uns "postaletes" para impedir que viaturas circulem por cima das ruínas que estão na parte avançada do pátio?

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Academia da Ribeira de Muge - "As Brincadeiras"

As Brincadeiras, foi um ritual que aconteceu em Paço dos Negros, entre os anos 20 e 70 do século XX, nos dias de Quinta e Sexta-feira Santas.

"Eira do Pombas"


A Festa e o Sagrado de Transgressão

Dependentes de uma agricultura cujos métodos de exploração eram rudimentares, a mourejar do sol-fora ao sol-posto, as pessoas na aldeia viviam muito ligadas à Natureza. Existia uma sacralidade cósmica na relação das pessoas com a Natureza.
As Brincadeiras, ajuntamento anual, desfile de cultura popular, aparentando ser um mero encontro profano, mais não é que a criação, o reconhecimento de um tempo e um espaço diferenciados. O espaço temporal em que decorrem os festejos torna-se, para o povo, um espaço inscrito no tempo, tempo que é um tempo cíclico, inviolável, que aguardam ano após ano. O espaço físico sendo um espaço secular é para estas multidões rumorosas e festivas ocupado como um espaço simbólico sagrado. Povo habituado ao sofrimento, quando não à fome, sendo dois meios-dias de jejum, que cumprem a rigor, não há lugar sequer para a comida e a bebida, muito menos os seus excessos. É assim criado um tempo e um espaço fortes em que as cantigas e os jogos campestres são claramente os elementos aglutinadores do grupo social que é a aldeia.
Ano após ano, durante a Quaresma, tempo de jejuns e interditos, toda a aldeia se mobilizava para as “Brincadeiras”. Após quarenta dias em que não era socialmente permitido o cantar profano, com o culminar da Quaresma, durante a qual, de lúdico apenas tinha havido as trocas de compadres, a Semana Santa tudo indicava que fosse um tempo ainda de maior recolhimento; não é, há como que uma antecipação da expansão final. Nestes descantes, jogos e brincadeiras em dia de Quinta-feira Santa é, contudo, notória uma inter-relação entre o lúdico, o profano e o sagrado. Há como que um ritual profano mas que se confunde com o religioso em que, o mito, para toda a população, está presente nos gestos ciclicamente repetidos.
Nestes rituais profanos, que aconteciam em dias de grande densidade religiosa, havia como que uma estruturação de um tempo primordial que era actualizado anualmente nestes folguedos. A participação no evento era de tal modo vivida que o sentimento existente era quase trans-humano. À falta de meios materiais, o excesso próprio da festa era posto no único bem de que podiam usufruir: as cantigas, os jogos e toda a alegria que era intrínseca à sua condições de almas simples
 – Na Quinta e na Sexta-feira santas, íamos do trabalho para as Brincadeiras e das Brincadeiras para o trabalho, sem comer e nem fome tínhamos, diz-nos uma informante.

Submissão e resistência – A construção da identidade de grupo
Nestas festividades a população permitia-se festejar sem o controlo directo tanto da Igreja como dos patrões, evidenciando ser este o resultado de uma inconsciente confrontação entre o sagrado de regulação e o sagrado de transgressão, e acontecendo por esta via a regeneração da ordem através de um caos dominado, o que permitia ainda conferir uma forte identidade de grupo à população da aldeia. Mais que uma religiosidade institucionalizada, parece existir uma vivência de um tempo sagrado onde as pessoas são arrancadas à sua intimidade para se entregarem a um turbilhão de actividades lúdicas nestes dias, deixando-se arrastar por um arrebatamento colectivo.
Patenteiam ainda, estes tão espontâneos e ansiados folguedos, numa época em que os direitos dos trabalhadores eram escassos, uma oportunidade rara de interromper a labuta diária, e os deveres dos trabalhadores não obedeciam a normas contratuais rigidamente escritas, mas à palavra dada, uma forma de resistência popular simbólica, a coberto do religioso, perante a dominação social a que as populações estavam submetidas, e simultaneamente a criação de alternativas, a esta submissão. Estavam criadas as condições para uma forte identidade comunitária, entre iguais, em que a integração e a pertença grupal não permitia sentir o peso e os constrangimentos sociais.

A sacralização de um espaço simbólico
Dentro do universo cultural que é a aldeia, as cantigas, as danças de roda, os jogos, e mesmo as cantigas que frequentemente adoptavam a configuração de um jogo, que, de repetitivos, ano após ano, obedeciam ao cânone reservado, quase exclusivo para estes dias. Ainda hoje, na aldeia, determinadas cantigas e jogos como a Condessa, a Biloa, os Bem-casados, a Troncha-la-moncha, o Babão e muitos outros, foram apropriados e são referenciados como cantigas e jogos das Brincadeiras.
A festa era uma dimensão social importante para o povo. Vemos na reconstituição dos ambientes festivos pelas nossas informantes, quão importante é ainda hoje para a população de Paço dos Negros, homens e mulheres que conviveram com estes ambientes rurais, a referência saudosa aos festejos e ao próprio local onde durante décadas os mesmos se desenrolaram. Valorização esta destes espaços simbólicos, que se insere dentro de um conceito onde os espaços físicos são valorizados, em que rapazes e raparigas aproveitavam estes rituais festivos, que aguardavam o ano inteiro, para brincar e para se divertirem.

As Brincadeiras como um ritual de iniciação
Neste tempo e neste espaço primaveril, em que toda a natureza se renova, as pessoas agem como que participantes de corpo inteiro de uma nova criação. Quantas vezes através da mudança de estado, passando à condição de adultas, os rapazes, mais as raparigas, entravam na roda, outras vezes mostrando-se à sociedade, a toda a aldeia, como par de namorados, aldeia que está presente nestes festejos campestres e que aguarda um ano inteiro por estes rituais.

Ainda hoje dentro da localidade existe o Arneiro do Pombas que, embora circunscrito a uma área reduzida, com os seus sobreiros, a sua grande eira ensaloada.


segunda-feira, 19 de abril de 2010

Academia da ribeira de Muge - "Verso" do David Cravinas

No ano de 1956, no sítio do Salgueiral, um drama muito sentido que deu que falar em toda a charneca do concelho de Almeirim:


O jovem David Cravinas, no dia da inspecção militar, por uma futilidade, na taberna do Salgueiral, assassina João do Guarda.
Mais uma vez, as mulheres através do canto espalharam o sucesso.

Nas conversas que mantivemos aquando da recolha deste “verso”, foi-nos dito, entretanto, que para além das futilidades a que se refere o mesmo, teria havido motivações de honras e brios pessoais, que decerto não havia interesse em referenciar.
De salientar que este facto, conteúdo, e a estrutura do “verso” que, em meados de 50, já não termina com as usuais “Torradas novas torradas”, bem como no remate final é isento de significado moral condenatório.

Autoria atribuída ao poeta popular e acordeonista, Joaquim Cego.

Clique para ouvir: David Cravinas

sábado, 17 de abril de 2010

Contos de Entre-Muge-e-Sorraia - A trovoada

Paisagem da Ribeira da Calha do Grou ao Monte da Vinha-Salgueiral


Para quem não teve oportunidade de ler n'O Almeirinense, um conto das gentes simples desta região.

Era uma vez uma mulher que era caseira no Casal das Mulas, na ribeira da Calha do Grou. Naquele tempo era só carreiros, e ela nem carro nem bois, ia aviar-se a pé, ora à Lamarosa ora aos Paços.
Como a única volta que dava era ir à loja, arejava então a arca e arreava-se com as melhores roupas e com todo o oiro que tinha.
Um sábado de tarde, lá vai a senhora Maria, carreirinho fora, com o talego à cabeça, aviar-se aos Paços.
Na volta, quase noite, viu armar-se uma trovoada e ela tinha muito medo dos trovões. Mas como tinha pantado o cordão de oiro, e tinha ouviste dezer que a quem se agarrasse ao oiro as faíscas não faziam mal, que o oiro tinha assim um poder magnetio, a correr pelo meio dos sobreiros, quando vinha um relâmpo, agarrava-se ao cordão, vinha um trovão e agarrava-se aos brincos.
Depois escureceu rapidamente, começou a chover que Deus a dava, os relâmpagos eram coriscos, ainda longe de casa, sozinha, sem telheiro onde se acoitar, nem vivalma que lhe acudisse, diz que as faíscas acudiam aos sobreiros, olhou para um lado e para o outro, a ver onde se podia abrigar. Viu uma barreira alta, e esta tinha uma pequena cavidade por baixo das raízes de um sobreiro. A ver se não ficava sem fio enxuto, o chão a estremecer, uniu-se à barreira, cheia de medo. A tremer como varas verdes, meteu a cabeça dentro do buraco. Cada vez se agarrava mais às orelhas e ao cordão a ver se dava sorte de a trovoada passar.
Naquela altura os magalas vinham da estação de Santarém e galgavam esses caminhos todos a pé.
Por sorte ou por azar, um magala que vinha da tropa, mas como a chuva também molha magalas, os trovões eram cada vez mais fortes, viu estar aquela mulher com a cabeça metida no buraco, acoitou-se.
Quando sentiu que o chão tinha parado de estremecer, a mulher até lhe parecia que tinha estado a sonhar. Tirou a cabeça do buraco, olhou para o céu onde um sol envergonhado começava a espreitar. Ainda incrédula e atordoada, mas agradecida, disse:

Não sei se isto foi por Deus
Se foi por louvor de algum santo
Mas nunca houve uma trovoada
De que eu gostasse tanto.



sexta-feira, 16 de abril de 2010

Para a História de Paço dos Negros

São vários os documentos que durante o século XVIII, com o desmembramento da coutada da Ribeira de Muge, mencionam como Casal do Desembargador a propriedade actual e popularmente chamada Casal do Trinta, a mesma que no século XIX era denominada Casal de Pina Manique, na posse de Paulo Nogueira de Pina Manique.

Anexo excerto de mapa de finais do século XVIII


Assento de defuntos, Raposa, 3-11-1735

Maria Gonçalves, moradora no Casal do Desembargador. (António Teixeira Alves, noutros documentos).









quinta-feira, 15 de abril de 2010

Interresante debate sobre cultura popular em Paço dos Negros

Eh pá, parece que anda por aí gente muito enxofrada por eu dizer o que é uma realidade cultural.

Aliás um cientista do social só pode estudar e dizer a realidade, tal como a interpreta, cientificamente. Cabe a outros fazerem a refutação, com argumentos. De preferência científicos.

Peço desculpa a todos os que se sentiram melindrados, mas especialmente ao Dr. Aquilino por ter usado o seu nome. Interpretei, tal qual como pus no blog, a questão da escolha destes temas "inéditos", e dos ensaios destes, para apresentar aquando da apresentação do livro da Deana Baroqueiro.
Foi o que me apercebi, foi graças à sua persistência, não foi fácil, não queriam aceitar sequer a Dança do Fidalgo, a única pérola que, à data, Paço dos Negros podia apresentar em qualquer parte do mundo em qualquer festival de dança popular. Recusavam-se sequer a dançá-la, em Paço dos Negros, terra onde nasceu e foi recolhida. Não sei se por vergonha, se por ignorância. Não interessa, a segunda conduz à primeira.

Para ensaiarmos a D. Inês, essa pérola do romanceiro nacional, recolhida em Paço dos Negros e com uma característica local muito própria, entre dezenas aqui recolhidas, recordo que foi uma carga de trabalhos. Depois, mostrando que pouco lhes interessaria conseguir a melhor interpretaçaõ, só faltou digladiarem-se, que «eu sou mais artista que tu para interpretá-la. Uma vergonha»

Para aceitarem apenas estas duas pérolas da nossa cultura, não se conseguiu mais, e o momento, a Deana, o livro D. Sebastião e o Vidente, que põe Paço dos Negros no centro da trama, que levou à perda da independência, exigiam mais, pois para aceitarem uma ideia nova, provada cientificamente, pareciam, como diz o povo, carneiros por corda, ou animal quando vai para o matadoiro.
O seu cânone do gosto ainda só lhes permitia aceitar o fandango de varapaus, essa fraude, esse embuste circense que nunca existiu, criação de um renomado folclorista dos anos 50. (informem-se, com espírito humilde, pronto a aprender, junto de um insigne folclorista de Santarém actual).

Hoje já temos mais peças que, de algum modo nos transportam para este nosso glorioso passado, graças às nossas pesquisas e à cultura das nossas velhinhas avós, algumas já partiram, a quem todos muito ficamos a dever.

A propósito, dou-lhes a ouvir mais uma pérola recolhida nesta nossa magnífica Ribeira de Muge, que talvez remonte ao século XVIII. Démos-lhe o nome de "canção de escravas".

Peço desculpa pela má gravação, mas foi ao primeiríssimo ensaio, na Academia: ontem, dia 14. No próximo melhoraremos, e substitui-la-emos.




quarta-feira, 14 de abril de 2010

Dois crimes na Ribeira de Muge






Nesta carta do Corregedor de Santarém dirigida a el-rei, vemos que no ano de 1542 ocorreram dois graves crimes na Ribeira de Muge: A morte de um moleiro e o abuso de uma mocinha. Uma mulher que se fora queixar ao rei, a Évora, e a justiça que funcionou.

O Corregedor diz que dera execução ao mandado, ordenado por el-rei e prendera os dois criminosos, com muito trabalho.

«Senhor, Tanto que ora comecei a servir de Corregedor por comissão do licenciado João Videira me foi dado em culpa um Diogo cabreiro que foi de Nossa Senhora da Serra por ser culpado na morte do moleiro da Ribeira de Muja e assim um vaqueiro de alcunha Mãodelete(?) que é culpado na força que foi feita na charneca a uma mocinha que ia com sua mãe... e esta se foi queixar a Vª Aª a Évora...»

Relata o Corregedor que apesar das dificuldades, andaram toda uma escura noite, pelas charnecas, à chuva, e andando mais de sete léguas, os foram prender prós lados da Erra.

E hoje, olhariam os nossos reis para uma pobre mulher injustiçada, que calcorreou 100 quilómetros a pedir justiça? Estarão os nossos muitos reizinhos engravatados, empenhados em fazer justiça, mormente a uma esquecida mulher numa qualquer ribeira desconhecida?

E estarão os nossos corregedores, agachados na sombra dos gabinetes, empenhados em calcorrear caminhos, de noite e à chuva, para executá-la?

Uma lição.

Casal da Varzea Redonda, na paradisíaca Ribeira de Muge, cujo moinho foi mandado construir no ano de 1547.


 

terça-feira, 13 de abril de 2010

Convite da Academia da Ribeira de Muge


Num futuro que esperamos breve, quer a Academia Itinerarium XIV-Ribeira de Muge, poder receber os visitantes do Paço dos Negros da Ribeira de Muge, com quadros que recriem as várias fases da vida neste Paço, ao longo dos séculos. Desde o reinado de D. Manuel I a D. Maria I.


Recreação no Paço, de Manuel Evangelista


Pensa esta Academia poder um dia vir a presentear os visitantes e turistas, com uma exposição permanente, a recreação de uma montaria, um casamento na capela, a vida dos negros nas suas palhotas de pau a pique com as suas danças, o fabrico da farinha no moinho e do pão no forno, etc.

Para tal está empenhada a Academia a fazer as recolhas ainda possíveis, em todas estas vertentes.

Dança do Fidalgo – uma dança palaciana, que denota ser genuína, que o povo de Paço dos Negros tornou como sua, dançada em estreia, por quase imposição do homem que mais trabalhou para este evento, e minha, para a apresentação do livro D. Sebastião e o Vidente, de Deana Barroqueiro, no Paço. Um livro cuja trama, também se faz passar neste Paço.
Foto do autor

Clique para ouvir: Danca do Fidalgo

Ó preto, ó preto – uma dança, quiçá um resquício das danças de negros, que os homens dançavam em Paço dos Negros, ainda, há cerca de cem anos.

Clique para ouvir: o preto o preto


A mulatinha – uma canção recolhida na Ribeira de Muge, em dois locais distintos, no território da antiga coutada, que vai do Moinho de Vasco Velho ao Pego da Curva.

Clique para ouvir: A mulatinha


Para já, e enquanto este programa não é possível, para visitar e conhecer a história deste Paço, basta marcar a visita pelo Telm. da Academia:

934105455

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Estudo de caso na Academia - A Rainha


O principal “pecado” do folclore tem sido o notório desconhecimento e falta de respeito pela cultura do povo, a ausência de um trabalho de pesquisa sério e análise das recolhas no contexto histórico e social em que se insere, mesmo de um estudo comparativo com outros cancioneiros. Representar o passado sem mostrar empenho em conhecê-lo tem originado verdadeiras barbaridades. Em Paço dos Negros, que é ainda um manancial a descobrir, que é o caso que nos interessa tratar, mas não só.

Hoje vamos analisar uma bonita melodia, por nós recolhida em Paço dos Negros, que é dançada pelo Rancho Folclórico da Casa do Povo de Almeirim, com o título: Lá vem a rainha e que, como homem do povo, nos deixa maltratados. Consta, incompleta, das valiosíssimas recolhas de Álvaro Pina Rodrigues.

Nesta moda, é notório que as duas quadras de que originalmente seria composta relatarão um facto histórico: A partida da Família Real para o Brasil. Não serão de origem genuinamente popular.

Clique para ouvir: La vem a rainha
 Almeirim

Eu sou aquela mulher
Que do mar trouxe a rainha (2)
Lançar as velas ao vento
Leva a vela direitinha (2)

Clique para ouvir: A rainha
Paço dos Negros

Quem foi (é) aquela mulher (galera?)
Que no mar leva a rainha (2)
Deitou os olhos ao mar
Lá vai ela direitinha (2)

Almeirim:
Leva a vela direitinha
Não vá a barca encalhar (2)
Lá vem a nossa rainha
Por sobre as águas do mar (2)

Paço dos Negros:
Lá vai ela direitinha
Não vá a vela tombar (2)
Lá vai a nossa rainha
Sobre as águas do mar (2)

Num processo popular criativo e evolutivo normal, terão sido adaptadas e, introduzindo-lhe um refrão, dançadas pelo povo. Com o decurso do tempo foi-se adulterando até chegar a:
Eu sou aquela mulher
Que do mar trouxe a rainha
Ambos os casos cantam no primeiro verso, esta “mulher”: No caso de Almeirim, “Eu sou aquela mulher”, no caso de Paço dos Negros, "Quem foi aquela mulher", o que não sendo uma canção religiosa, tira todo o sentido ao verso quando, na segunda quadra, em ambas, aparece por exemplo: “Lá vai (vem) a nossa rainha/por sobre as águas do mar.”

Com pequenas diferenças entre elas, o discurso alterna, ora no passado, ora no presente, facto que nas recolhas populares é frequente, sem contudo desvirtuarem o essencial.
É manifesta a representação de factos inverosímeis (uma mulher que trouxe a rainha?) e torna ininteligíveis o que denota serem factos históricos. Sem questionamento. O que empobrece a cultura popular e por vezes deixam o folclore pelas ruas da amargura, afastando novos amantes, pois mais parecem tolinhos que estão ali numa representação circense, sem saberem a razão porquê.
Linguagem popular, sim, quanto mais melhor, mas alienação e deturpação não.

HIPÓTESE ACADÉMICA: Não será o termo GALERA que ali foi roubado?

QUEM É AQUELA GALERA/QUE NO MAR LEVA A RAINHA...O povo que todos os factos históricos cantava (que tentou embarcar), não nos levará ele ao ano de 1807, que durante dois dias viu a Corte, e dezenas de navios, ficarem a pairar no Tejo, à partida da Rainha e do príncipe regente para o Brasil?
Lá vai a nossa rainha
Por sobre as águas do mar

É uma hipótese que a Academia da Ribeira de Muge vai continuar a investigar.

Recado: um elemento desta Academia (futura) acaba de receber três chaves do Paço, do sr. Vereador da Cultura da Câmara de Almeirim, para ali poder ensaiar. Mas esta Academia que dizer ao sr. Vereador, que sendo um princípio, é insuficiente, se há alguém em Paço dos Negros que merece ser guardião das chaves da Paço, essas pessoas estão nesta Academia, todas, pois não aceita ser discriminada em relação a outros que o que têm feito pelo folclore e pela cultura de Paço dos Negros e da Ribeira de Muge, é servirem-se do trabalho de outrem. Caso das danças, recolhidas, criadas e ensaiadas, magnificamente, pela Gina, e das letras das músicas de que esta senhora é a única autora. Em próximas actuações espero ver por este grupo de dança e música popular, de autor, anunciada a autoria das letras, sob pena de estarem a cometer um possível crime de usurpação. Facto que já aflorei no post anterior.
Peço ao sr. Vereador, que está tratando este caso das chaves de modo errado, roçando a traição e a cobardia, pois bastava dar uma ordem, e as chaves que haviam sido atribuídas pela própria Câmara, decerto seriam entregues de imediato por quem as detinha. Se alguém detinha chaves “ilegalmente?”, seriam precisamente os seus favorecidos.
Sr. Vereador quer um conselho? Deixe-se de actuar fazendo rapapés à fama e às palmas fáceis e ignorantes, em detrimento do trabalho isento, do estudo e da investigação e o concelho de Almeirim ganhará e voltará a ser grande e respeitado.

domingo, 11 de abril de 2010

Mulheres da Ribeira de Muge - Baldoninha

"Verso" cantado pela mulheres de Paço dos Negros, durante anos a fio, dentro dos canteiros de arroz.

É cantado por Leonor Florêncio, uma grande cantadeira e bailadeira.

Cilque para ouvir: Baldoninha

Prepara-te ó Baldoninha
Já me estou a preparar
Ao balho da reinação
Não podemos lá faltar

Vamos embora minha mãe
Já podemos abalar
Já lá estão sete rapazes
Para comigo dançar

Ai então ó Jozesito
Ela aí vai a entrar
Vê se ma deixas em pontos
De ela ao balho não voltar

Cale-se aí ó mulherzinha
Não me esteja a apoquentar
Nó semos sete rapazes
Para a sua filha estafar

Ela assim que lá chegou
Logo se foi assentar
Eram sete balhadores
Menina venha balhar

Boas noites meus senhores
Boas noites venho a dar
As raparigas são poucas
Eu também quero dançar

Quando chegou ao meio do balho
Um grande grito atirou
Disseram uns para os outros
Baldoninha arrebentou

Quando ela saiu do balho
Do peito se ia a queixar
Ao balho da reinação
Onde eu vim a arrebentar

Os rapazes que a levavam
Choravam do coração
De ver o sangue a saltar
Para fora do seu caixão

O fato que ela levava
Era de seda amarela
Que toda a gente chorava
Por aquela linda donzela

Torradas novas torradas
Lá para trás dos olivais
Esta moça foi criada
Nos foros dos Marinhais

sábado, 10 de abril de 2010

A Escola

Turma da Escola Priméria, do ano lectivo 1952-53. Foto tirada no dia 10 de Dezembro. Professora: Maria de Jesus Borrego. A primeira professora que, de modo sistemático, veio ensinar Paço dos Negros. Esteve até ao final da década de 50.

Podem ver-se crianças descalças.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

O Aforamento de Paço dos Negros

Recibo de pagamento à Casa de Atalaia, do foro de parcela de terreno, em Paço dos Negros, no ano de 1959.
terrenos que, na sua maioria haviam sido aforados em 1903-4.
RETIRADO

quarta-feira, 7 de abril de 2010

O Paço da Ribeira de Muge e o Gang das Fechaduras


Hoje, 7 de Abril, após mensagem a dizer que o problema das chaves estava resolvido, mais uma vez, a futura Associação Academia da Ribeira de Muge foi impedida de reunir no Paço da Ribeira de Muge. O mesmo agrupamento, cujos membros foram pioneiros na limpeza do Paço, em 2005, e os únicos que estão empenhados na investigação e ciência da história deste, e no conhecimento da cultura de Paço dos Negros e da Ribeira de Muge.

O Paço da Ribeira de Muge, o tal que para o dito lóbi cegueta instalado em Almeirim, ainda ali só existe o Pórtico. (Entretanto existem, para já, seis fechaduras).



O Paço da Ribeira de Muge que parece agora está a ser comandado pelo Gang das Fechaduras.

É claro que o senhor vereador da (in) cultura da Câmara Municipal de Almeirim, depois de no dia 27, ter aparecido de surpresa perante alunos e professores, a dizer palavrões e a fazer de porteiro, tudo fará para impedir que a Academia se forme, apresente a genuína cultura do Paço, dos Negros, e da Ribeira de Muge, não só as danças, mas também o romanceiro, os despiques, os casares, o teatro popular, o rituais de trabalho, os rituais de iniciação, passando todos as peças pelo crivo da ciência, corrija os atentados culturais que o Rancho Folclórico, seu protegido, tem vindo a cometer em nome da cultura de Paço dos Negros. Ficam bem um para o outro, vereador e rancho, tal como ele está neste momento.

Eis um exemplo de um atentado à cultura e à dignidade das mulheres, o qual só pode trazer indignadas as mulheres da terra, como se tem visto. As mesmas mulheres que deveriam ser ouvidas, nas recolhas, para que se não façam afirmações inconscientes e tolas:

Para que o Rancho justifique pôr mulheres a dançar o fandango, como tem posto, afirma (ou) o dito rancho, que quando os homens iam para a guerra, as mulheres iam para o baile e dançavam então o fandango. Não necessitavam de ofender as mães e as avós.

Eis a postura corporal e social, de dignidade, que tomavam as mulheres de outros tempos, quando os maridos, os namorados, os irmãos, iam para a guerra:

Rapariga a ler carta do namorado que está na guerra do Ultramar - 1961



Um verso de 1961. Ó militar ó galucho


Um verso de 1915-18 António Domingos


O Gang das Fechaduras pode muito bem continuar a proteger a fraude cultural, a espalhar e a permitir disseminar o erro, mas este não durará eternamente.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Diogo Rodrigues, 1º almoxarife

Diogo Rodrigues, uma história recambolesca?

RETIRADO
Como se vê tramóias sempre parece tê-las havido neste Paço. Nada de novo ao cimo da Terra.

domingo, 4 de abril de 2010

A capela de S. João Baptista

Até há três anos atrás, nada se sabia sobre a vida e o patrono desta capela, tal foi o desprezo e vandalismo que foi votada nos últimos cem anos. Ao ponto de muitos, com responsabilidade, fazerem que não existia. (Lembremos o lóbi do Restopórtico instalado em Almeirim).

Agora que através de documentos se conhece o santo a quem era votada, continua desprezada, o telhado deixa entrar a chuva. Sobre o reboco e a cal que nunca viu, e as portas não me quero pronunciar.

Segundo informação recolhida, e fidedigna, por cima da porta, abaixo da cruz, existia no intrigante buraco na parede, que a foto mostra, uma pomba em pedra. Seria a pomba do Espírito Santo que, na Bíblia, desceu sobre Jesus, aquando de seu baptismo por João Baptista? É provável.

Tivéssemos nós em Almeirim, responsáveis pela cultura que não fossem meros especialistas em mudar fechaduras, mais parecendo que para tramar a evolução e o progresso de Paço dos Negros, do que empenhados em defender a sua cultura e, com pouco dinheiro, breve teríamos o Paço restaurado, mormente nestes aspectos simbólicos.
Mas se eles se recusam a classificá-lo? São uns ignorantes que não merecem o lugar que ocupam.


Clique para ouvir a prova: A Pomba do Paço



Foto onde pode ver-se o buraco cujo sítio ostentava a dita pomba

sábado, 3 de abril de 2010

Fazendas de Almeirim e a Bergamota


Já há muito que tenho conhecimento de uma “moda” do Rancho Folclórico de Fazendas de Almeirim, denominada Verga Mota. Não sei, nem nunca ouvi, o significado e origem desta.

Talvez que nos Papéis de S. Roque, Henrique Leonor Pina, pela pena de Simão Vinagre, esse autor esquecido almeirinense de uns escritos quinhentistas, nos leve à origem desta pérola.

No ano de 1575, no regresso de Évora para Almeirim, onde fora acompanhar D. Sebastião, no Paço de Salvaterra Simão Vinagre encontra João Francisco Velanes, hortelão e pomareiro, que lhe falou de sua mãe e seu tio, Pasquim Velanes, italianos de Bérgamo, terra de belíssimos limões e cheirosas cidras, a que chamam bergamotas.
Vieram para Portugal, seu tio para cuidar especialmente das laranjeiras e jardins do Paço de Évora, por conta d’el-rei e escolha do senhor D. Álvaro de Castro, e mais tarde do Paço de Santarém e de Salvaterra. Em Santarém trabalhou com Joaquim Mendes, pomareiro do pomar real de Almeirim, já velhote, onde agora ia muitas vezes falar com o pomareiro seu amigo.
Falam das laranjeiras de Almeirim, de casca grossa, e das bergamotas que têm a casca mais fina.

Pesquisando na Internet vemos que ainda hoje, no sul do Brasil, se dá o nome de bergamota ou vergamota a uma espécie de citrino, uma tangerina de excelente qualidade.
É originária da Ásia. A origem do seu nome vem de onde a fruta era cultivada e vendida, em Bérgamo. Planta muito aromática, tem propriedades terapêuticas: anti-séptica, anti-inflamatória, antidepresseiva, antiviral, antibiótica. Combate diversos vírus, entre os quais os causadores da gripe, herpes, cobreiro e catapora. Devido às suas versáteis propriedades antibióticas, também trata de infecções bacterianas no sistema urinário e diversas condições de pele, entre as quais eczemas.

Analisando semanticamente o verso popular vemos que Vergamota é classificada de coisa rara, “pau de luxo”.

Numa época em que a terra ainda não estava distribuída, uma nova e tão excelente variedade de laranjas, quiçá cultivada apenas nos pomares reais, só poderia ser um luxo. Por vezes até, desdenhado por quem lhe não poderia chegar.

Verga mota, verga mota
Verga mota pau de luxo
Tenho raiva a quem é alto
Meu amor é pequerrucho

Clique para ouvir um excerto: VERGA MOTA

Será a moda desta época? Será mais tardia, do século XVIII e XIX quando o povo começou a ser dono das terras da coutada? Não me parece.

É este contributo que se for útil, neste renascer de Páscoa, quero deixar ao Rancho de Fazendas de Almeirim, que sei que está apostado em conhecer as raízes e dignificar a palavra FOLCLORE.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Os bobos da Corte


Naquele ano, os trovadores da Ribeira resolveram cantar as suas ancestrais trovas no Paço.
Mas na realenga vila, alguns habituados que estavam a só eles terem festa, ele eram caçadas, as canas, os torneios de canasta, os saraus literários, as procissões; no teatro eram as farsas, as comédias, não viram com bons olhos o aparecimento da nova trupe de comediantes. Que eram o fim das suas imitações e plágios, diziam.
Na Sintra de Inverno havia um bobo da corte, que de quando em vez trinava a erva-cidreira, combinou com um escravo que no Paço residia, e que de vez em quando era chamado à realenga vila, para a votação em carneirada, e à traição mudaram as fechaduras, para impedir que houvesse quem lhes fizesse sombra, que ninguém lha queria fazer.
Consta que o rei não gostou e intimou-os a que tivessem a porta aberta na hora do espectáculo no Paço da Ribeira, já programado pelos novos rapsodos.
Então, como tinham que abrir a porta, mas não queriam abrir a porta, em cima da hora, resolveram abrir sem abrir, assim como no conto, em que um tal João-Sem-Cuidados deveria, perante o rei, apresentar-se ao mesmo tempo, nem vestido nem despido, nem a cavalo nem e a pé, nem calçado nem descalço, eles foram pela calada da noite e abrindo a porta, deixaram-na fechada e às escuras.
Só que o assunto não ficou resolvido porque os novos rapsodos exigem ser tratados com a dignidade que merecem.
(Este conto remete para o ano de 1527, ao tempo de Mestre Gil, Qualquer semelhança com o presente é pura coincidência.)
Este cronista vai abrir um buraquinho da fechadura da porta e o leitor pode espreitar como decorreu esse espectáculo.

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