segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O ritual da Adiafa na Ponte Velha

O ritual da adiafa constituía o comemorar de um fim de ciclo. Por vezes o fim de um longo período que poderia ser até bem penoso, mas que tinha o condão de transformar um espaço e um tempo profano de algum modo num tempo e num espaço sagrado, de festa, funcionando como terapia individual e colectiva, na cura dos males do corpo e do espírito.


Cantando e bailando, havia uma troca, ofereciam e recebiam: os efeitos de agradar, a protecção, a segurança: «O patrão dava (...) mas a gente tinha que lhe dar....». Os artigos que eram objecto de troca: Bolos e bananas; coisas boas e raras naquele tempo, as primícias. O doce do arroz doce. O pão e o vinho, com todo o seu simbolismo. O carneiro, sempre o carneiro, (numa região onde predomina o porco), o símbolo da oferenda a Deus: Abraão, a imolação de Isac. Não podemos esquecer que estes momentos eram sempre acompanhados de música e danças. Os cantares eram omnipresentes.

O nosso rancho/Vem a chegar/Saiotes feitos/Sempre a cantar.

Sempre a cantar/Desta maneira/Vimos trazer /A nossa bandeira.


Adeus ó patrão Manel/Mais a patroa Maria/Adeus até p´ro ano/Ou será para toda a vida.

J. Vitória uma das mulheres que viveu esta e outras adiafas: «No fim dos trabalhos havia sempre uma adiafa. O patrão dava a adiafa mas a gente tinha que lhe dar uma bandeira. Uma bandeira muita grande, carregada com bolos e bananas. O patrão dava a comida e o vinho. Era sempre batatas com carneiro. Na ceifa era arroz doce. Na monda era o carneiro.Fazia-se aquilo para agradar ao patrão. A gente dantes fazíamos tudo para agradar ao patrão».

Estas práticas, mesmo que perdendo o cunho sacrificial religioso, mas por uma certa solenidade posta nas atitudes e realizações, pelo simbolismo, a sociedade mantém a capacidade de transformação dos espaços e vivências.

Os capatazes oferecem a bandeira,1954