quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Moinhos, caminhos, e descaminhos da Ribeira de Muge

Teve a Ribeira de Muge ao longo de seis séculos cerca de 20 moinhos, os quais foram recebendo designações diversas. Tiveram como construtores, donatários ou arrendatários, as mais diversas personagens, desde moleiros, criados, clérigos, frades, escudeiros, almoxarifes, desembargadores, fidalgos.
De entre outros, as referências ao moinho do Paço, do Pinheiro e da Ponte Velha, remontam a finais do século XV, inícios de XVI, anterior à construção do Paço. Era seu titular Vasco Palha, contador-mor de Santarém e almoxarife no Paul da Serra, na ribeira de Muge. Moinhos estes, e terrenos, que cedeu em escambo ao rei D. Manuel para a construção do Paço.
São contudo, três moinhos a sul de Raposa, aqueles cujas referências são as mais precoces.
Vemos em uma carta de D. Duarte, de 1434, na qual, por mor de uma contenda, foi ordenado fazer a demarcação dos concelhos de Muge e Santarém, pela estrada que vai para Coruche, pelo moinho da Riguefeira: «…as terras e termos daqui em diante sobre que a dita contenda é, será partida e declarada por esta guisa que se segue: e assim como vai da estrada pelos moinhos da Riguefeira para Coruche, e que da estrada para fora da contra Muja fique por seu termo e desce pelas outras divisões de uma e outra contra parte segundo ao que o concelho é divisado e demarcado e o concelho de Santarém haverá por seu termo da dita estrada para cima e em tal guisa que os moinhos que se chamam da Riguefeira fiquem em sua terra e seu termo». (ficaria este no concelho de Santarém e dois no de Muge).
Termo este, Regueifeira, que delimita a montante o termo de Muge, como confirmam várias cartas de D. Duarte, em que o dito paul vai desde a Ponte da vila até à Regueifeira, ou vice-versa.
Termo este que tomaria, ainda no século XV, o nome de Moinho de Vasco Velho, designação que manteria durante vários séculos e que aparece na delimitação da mata e coutada da Ribeira de Muge, até ao século XVIII, onde sempre diz: desde o moinho de Vasco Velho; com o tempo alternando a montante até: Mem Fernandes, Pego da Curva, Marmeleira…
Outros moinhos e outras designações se foram construindo e tomando.
O Porto da Regueifeira em 1459 era designado de Porto de Lançarote, do nome do seu titular, grada figura, morador em Muge. Teve outros titulares como, Aires de Sousa Coutinho e sua mulher, Filipa da Cunha, quando em 1568, sob a designação de “Moinho junto do Pontão”, foi feita esmola aos frades do convento de Nossa Senhora da Serra. Doação que durou até ao século XIX.
Este Porto da Regueifeira, em 1434 Lançarote, e Pontão desde meados do século XVI, vem confirmar sulcos ancestrais, bem racionais por sinal, já que evitavam penosos declives e encurtavam distâncias, como se pode hoje confirmar no terreno. no mapa anexo pode ver-se a estrada do Convento da Serra ao Pontão.)
O Porto da Corte dos Pegos (actual estrada da Raposa), aparece no século XVI, a encimar a Coutada das Éguas que vai desde o Porto da Regueifeira, até ao Porto das Cortes dos Pegos. Pegos das Ferrarias que ainda hoje são conhecidos e cantados, na Raposa.



Moinho da Ponte Velha


Hoje os caminhos da Ribeira de Muge são outros. São descaminhos. São caminhos de interesses. São caminhos de ignorância. A ribeira está a saque. Poluída. Abandonada há mais de 30 anos. Indivíduos que deveriam ser responsáveis, enchem a boca na sua defesa e ignoram-na. Baseando-se em conhecimentos que não têm, sem qualquer estudo científico que sustente a sua decisão, alguns sem conhecerem sequer onde fica a Ribeira, além da incúria que patenteiam para com os monumentos ainda de pé, agem como mercenários em terra alheia, preparando-se para lhe dar a machadada final. Será legítima a indignação dos cidadãos conscientes? Será que não é legítimo a um cidadão interrogar-se: Porquê?

Ribeira de Muge entulhada e poluída