quarta-feira, 1 de junho de 2011

Dos estudos da Academia

Sem a intenção de que alguém localmente se melidre com estes estudos, pois todos teremos a ganhar com a valorização da nossa genuína cultura, não pode, nem deve, um estudioso destas coisas da cultura, ficar calado perante certos atentados à nossa cultura popular. Atentados que, ainda que com boas intenções, só a prejudicam, porque fora da realidade. Nunca um povo pode progredir não conhecendo a realidade. Sem raízes profundas, fica-se pelo exibicionismo.


Com a devida vénia...

Até finais dos anos 30, a palavra “rancho” vinha sendo utilizada para identificar o grupo de trabalhadores que desempenhavam tarefas agrícolas por conta dos proprietários das quintas para quem trabalhavam” e que quando acontecia uma festa ou um grande evento que mobilizasse os grandes proprietários, aos seus trabalhadores era solicitada a participação para apresentarem os seus fatos mais antigos, músicas, cantares e danças”. De qualquer modo, e em minha opinião, estes “ranchos de trabalhadores” tinham uma essência popular que não existia nos grupos que em 1940, e para o enviar a Madrid, o SNI “farda” sob orientação de “3 etnógrafos” oriundos de Lisboa que transmitiram “uma ordem que vinha das entidades do Estado”.

Um dos casos, é o do Rancho Folclórico de Alte”, e sobre o assunto já tenho falado sobre o assunto com o seu responsável, sendo que os “trajos inicialmente recolhidos na formação do Rancho foram substituídos por outros pagos pela FNAT.

E ao que parece, também Sebastião Arenque, ao assumir em 1967, a orientação do Rancho “Ceifeiras e Campinos” de Azambuja, teve que fazer-lhe algumas transformações, retirando-lhe “todo o repertório, dado tratar-se de músicas compostas, poemas feitos e coreografias encenadas ou imaginadas, sem nada em comum com as usanças antigas das gentes da Azambuja”.

Era a regulação fiscalizadora dos ranchos folclóricos. Aliás, e antes de 1939 António Ferro reivindica para si esse papel de controlador e regulador, e não é por acaso que Salazar afirma: ”fazei as leis de um povo, mas deixai-me fazer as suas canções e veremos qual de nós governa esse povo”.

Em 1953, e enquanto o International Folk Music Council define a Música Folclórica como “ a música que tem estado sujeita ao processo de transmissão oral, que é produto de evolução e se acha dependente de circunstâncias, de continuidade, variação e selecção”, em Portugal sob o ponto de vista etnográfico a mesma era difícil de definir” devido à abordagem alienante do mesmo pelo SNI que ao pretender que o folklore fosse um elemento de actividade turística, acabou por desenvolver uma pretensa etnografia bonitinha, representativa de um povo pobre mas exótico, onde as formas espontâneas de expressão musical chegavam a ser corrigidas e emendadas, por entidades contratadas para o efeito, com vista a perderem a rusticidade original e adquirirem uma estética mais de acordo com os fins em vista.” (Almeida de Sousa)

Lino Mendes, em Cadernos de Etnografia e folclore, http://noticiasdoribatejo.blogs.sapo.pt/1049401.html

"músicas compostas, (plágio), poemas feitos e coreografias encenadas ou imaginadas...", para mais contém uma falsidade histórica. Das dezenas de mulheres idosas que ouvi, e das quais recolhi canções e danças genuínas, não houve uma que tivesse dançado, cantado, que conhecesse esta moda.

Oiça um extracto bem ilustrativo do texto acima.